sexta-feira, 18 de maio de 2012

Negócio do momento: abrir uma igreja na Pipa


Fraudes em nome de Deus por Dalmo de Abreu Dallari

Um fenômeno social que vem ganhando corpo nos últimos tempos é o aparecimento de grupos autodenominados religiosos, que, geralmente sob a direção de um líder, arrebanham adeptos, atraindo pessoas, quase sempre pouco esclarecidas ou socialmente frágeis, ou, ainda, dissidentes políticos ou religiosos aos quais oferecem um instrumento de oposição, e logo procuram formalizar a existência do grupo como uma nova igreja. E assim procuram obter proveitos materiais de várias espécies, em fraude à lei. Isso explica o aparecimento de novas igrejas em diferentes partes do mundo, inclusive no Brasil.
Percebendo a ocorrência desse fenômeno e desejando conhecê-lo melhor, para, entre outras coisas, despertar a opinião pública para os graves prejuízos individuais e sociais que isso pode acarretar, dois jornalistas ligados à Folha de S.Paulo, Cláudio Ângelo, editor de Ciência, e o repórter Rafael Garcia, decidiram criar experimentalmente uma nova igreja, evidentemente fundada numa fantasiosa crença religiosa.
Para tanto, com o objetivo de evidenciar a tranquila possibilidade legal de consumar essa fraude, solicitaram a orientação de um dos mais prestigiosos escritórios de advocacia de São Paulo, respeitadíssimo pelo alto nível de conhecimentos e pelo rigoroso padrão ético de seus integrantes – o escritório Rodrigues Barbosa, Mac Dowell de Figueiredo, Gasparian Associados. E assim adotaram as providências legalmente exigidas para concretizar a criação da igreja de fantasia.
Exploração da ignorância
Verificaram, então, que não existem requisitos teológicos ou doutrinários para a criação de uma igreja, não havendo também a exigência de um número mínimo de fiéis. Redigiram um documento de fundação do que denominaram Igreja Heliocêntrica do Sagrado Evangelho e fizeram a inscrição da entidade no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, obtendo assim o número do CNPJ.
Com base nesse documento abriram uma conta bancária, fazendo várias aplicações financeiras, gozando de isenção dos tributos normalmente incidentes sobre operações dessa espécie, pois, segundo a Constituição, no artigo 150, inciso VI, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos sobre templos de qualquer culto.
Nessa mesma linha, a nova igreja poderá adquirir e vender imóveis, realizar transações econômicas, cobrar pela prestação de serviços e praticar outros atos que beneficiem pessoalmente os criadores e dirigentes da igreja, sem que sejam obrigados a pagar o IPVA, o IPTU, o ISS e qualquer outro tributo. E como as igrejas são absolutamente livres para definir sua organização e direção e para admitir e manter seus sacerdotes, que, nessa condição, ficam isentos da obrigação de prestar o serviço militar obrigatório, um dos dirigentes designou seus próprios filhos como sacerdotes, garantindo-lhes, desse modo, essa isenção, devendo-se ainda acrescentar que, além desse privilégio legal, os sacerdotes terão direito a prisão especial, se forem envolvidos numa ocorrência policial.
Acrescente-se, ainda, que os dirigentes da igreja poderão indicar os imóveis de sua residência como sendo templos da igreja e assim ficarão isentos dos tributos municipais.
Essa iniciativa dos jornalistas, levada a efeito discretamente e sem procurar provocar escândalo, é merecedora do maior elogio e deve ser amplamente divulgada, para chamar a atenção dos que podem e devem influir para impedir a multiplicação fraudulenta de igrejas. Essa fraude deve merecer especial atenção dos legisladores e dos governos, pois além de acarretar enormes prejuízos a todo o povo, por criar a possibilidade de intensa atividade econômico-financeira sonegando tributos, alimentam-se da exploração da ignorância e da fragilidade de pessoas das camadas mais pobres da população.
Ação educativa
Bem ilustrativo da audácia desses exploradores da ignorância e da ingenuidade de pessoas mais simples é a notícia da criação de uma linha telefônica para falar com Deus, fato divulgado pelo jornal francês Le Monde (4/3/2010, pág.26).
Conforme registra com ironia aquele jornal, foi criado um novo serviço telefônico, “Le Fil du Seigneur”, iniciativa da sociedade Aabas Interactive. Fornecendo os dois números disponíveis para as ligações, informa o jornal que o custo das ligações é de 15 centavos de euro para as ligações comuns e de 34 centavos para as ligações urgentes e diretamente dirigidas a Deus.
Quem ligar para o serviço ouvirá uma gravação dizendo : “Você está em presença de Deus para o recolhimento e a prece a fim de receber sua graça”. Acrescenta o jornal, sempre ironizando, que os promotores desse piedoso serviço não estão autorizados a conceder absolvição por telefone, mas os interessados podem deixar sua confissão. E para acentuar os objetivos de apoio e edificação espiritual, uma gravação diz no início: “Para receber conselhos, digite 1; para confessar, digite 2 ; para escutar confissões de outros, digite 3″.
Parece absurda a criação de um “serviço” dessa natureza, mas o fato de ele continuar existindo é um sinal de que também existem usuários, o que deixa evidente que há ambiente para audácias desse tipo.
Num pronunciamento recente, o presidente da Ordem dos Advogados de Angola chamou a atenção para o surgimento e a multiplicação de práticas ilegais naquele país, ligadas justamente à exploração de crenças religiosas. E observou : “Não me surpreende o surgimento de crimes ligados à exploração religiosa, porque onde há pobreza, ignorância e um nível cultural extremamente baixo há propensão para que essas práticas religiosas duvidosas prevaleçam e tenham espaço”.
E sublinhando que a legislação angolana exige um mínimo de cem mil aderentes para a existência de uma igreja, o que considera bom mas insuficiente para impedir as fraudes, acrescentou que “é responsabilidade do Estado, nos termos da lei, controlar para que o direito de liberdade religiosa não seja utilizado para fins contrários ao que está previsto na Constituição”, considerando necessária uma ação educativa do Estado, mas também uma ação repressiva, para impedir práticas que, sob a máscara de atividades religiosas, prejudiquem os direitos de outros cidadãos e a própria ordem pública.
Necessário e urgente
Observe-se, afinal, que esse fenômeno da exploração religiosa, muito oportunamente posto em evidência pelos jornalistas da Folha de S.Paulo, vem preocupando vários países da Europa. Assim, na França já estão em vigor três leis tratando de questões relativas ao surto de organizações religiosas e suas repercussões legais. A primeira é de 18 de dezembro de 1998 e cuida, sobretudo, do problema do acesso de crianças à escola, que é obrigação dos pais e vinha enfrentando obstáculos sob alegação de motivos religiosos. A segunda, de 15 de junho de 2000, deu legitimidade às associações civis que lutam contra as seitas para propor ou integrar ações judiciais, inclusive na área penal, nesse âmbito. A terceira lei, de 12 de junho de 2001, trata dos movimentos sectários que atentam contra os direitos humanos e as liberdades fundamentais. Esta lei permite a propositura de ação contra fatos que podem ser qualificados como “abusos fraudulentos do estado de ignorância ou de fragilidade”, com agravantes quando praticados contra crianças ou pessoas em situação de fraqueza.
Essas questões já vêm sendo objeto de considerações do Conselho da Europa, que em 1992 fez recomendações relativamente às seitas e aos novos movimentos religiosos e em 1999 reforçou seu pronunciamento considerando as atividades ilegais das seitas. Como fica evidente, há uma situação nova envolvendo as questões religiosas, com efeitos graves sobre os direitos.
Por tudo isso, é muito oportuna a advertência sobre o que vem ocorrendo no Brasil nessa área. A Constituição brasileira declara inviolável a liberdade de consciência e de crença, mas ao mesmo tempo diz, no artigo 5°, inciso XVII, que é plena a liberdade de associação “para fins lícitos”. É evidente que o uso fraudulento da invocação religiosa nada tem a ver com a liberdade de crença e, ainda mais, por suas conseqüências de ordem prática, acarreta graves prejuízos a todo o povo, confere privilégios injustos e cria uma situação de conflito, opondo as organizações desonestas às instituições que se fundamentam, autenticamente, em crenças religiosas.
Assim, pois, é necessário e urgente que o tema seja posto entre as prioridades brasileiras, para que se tenha uma legislação que, mantendo a laicidade do Estado, garanta a liberdade de crença com pluralidade, coibindo a invocação fraudulenta dessa liberdade.

Leia também:
Jesus é um bom negócio - Guia Rápido para abrir uma Igreja

10 comentários:

Anônimo disse...

Chega a ser assustador como estas coisas se alastram e manipulam a mente fraca dos pessoas.

Nesta semana vi num programa de televisão uma tal Igreja Templária de Cristo, coisa ridícula... o tal pastor, ou sei lá nome que ele tem, diz que se comunica com o anjo Gabriel... e dá-lhe doação!!!


Agora essa tal de bola de neve em plena praça principal de Pipa... vamos ver o que vai acontecer...

Onde falta educação sobra religião!!

Anônimo disse...

Vamos abrir igrejas, afinal Jesus é um ótimo NEGÓCIO. Turismo religioso em Pipa. Uma igreja em cada canto!

Anônimo disse...

Faço parte dessa igreja que foi citada no panfleto, acho isso uma afronta a mais de 100 pessoas que já fazem parte da nossa comunidade... Amo a Igreja Bola de Neve!!

Anônimo disse...

O interessante é que o autor da matéria nem mesmo conhece o trabalho para poder citar imagem e o nome de uma Igreja que é tão conceituada no Brasil no meio dos jovens.

Sei que pelo trabalho dessa Igreja muitas pessoas conseguiram largar as drogas, inclusive meu irmão e meu pai..

Pelo menos essa Igreja trabalha para o bem dos outros...

E ESSE BLOG FAZ O QUÊ PARA A POPULACAO DA PIPA???

MUDA VIDAS?AJUDA PESSOAS A SAIREM DAS DROGAS, DO CRIME???

Parabens a essa Bola de Neve, trabalho primoroso!

Anônimo disse...

Sou catolico praticante.É triste ler matérias tão medíocres como essa...
Tanto assunto para se escrever, e temos que nos ater a uma materia tão ruim e ignorante.

Cada um na sua parceiro, se vc acredita...creia!
Se não fica quieto e respeita os outros!

Tomara que essa Igreja e outras em Tibau cresçam e calem a boca de muita gente....

Anônimo disse...

para quem não sabe quem é Dalmo de Abreu Dallari, o autor do texto publicado no blog.
Dalmo de Abreu Dallari
(1986 - 1990)

Nasceu em Serra Negra, Estado de São Paulo, a 31 de dezembro de 1931.

Iniciou os estudos das primeiras letras no Externato Sagrada Família e no Grupo Escolar Lourenço Franco de Oliveira, ambos em sua cidade natal, aí concluindo o curso primário. Em 1947, transferiu-se com a família para São Paulo, passando a estudar no Colégio Estadual Presidente Roosevelt, onde concluiu o curso clássico em 1952.

No ano seguinte ingressou na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, recebendo o grau de bacharel em 1957. Em 1963 concorreu à livre-docência em Teoria Geral do Estado; tendo sido aprovado, passou a integrar o corpo docente desta Faculdade em 1964.

Com a instalação do governo revolucionário, passou a ter destacada posição na resistência democrática e na oposição ao regime que se estabelecia. A partir de 1972, ajudou a organizar a Comissão Pontifícia de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, ativa na defesa dos Direitos Humanos.

No ano de 1974, venceu o concurso de títulos e provas para professor titular de Teoria Geral do Estado, vindo a prosseguir suas atividades universitárias, ministrando aulas no curso de pós-graduação desta Faculdade e, em 1986, foi escolhido para seu diretor, permanecendo até 1990. Na sua gestão foi iniciada a construção do prédio anexo da Faculdade.

Foi membro do Conselho Universitário e da Comissão de Legislação e Recursos da Universidade de São Paulo. É membro da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, da qual foi presidente, da Associação Brasileira de Juristas Democratas, do Instituto dos Advogados de São Paulo, do qual foi vice-presidente, além de ter presidido a Fundação Escola de Sociologia e Política.

De agosto de 1990 a dezembro de 1992 foi secretário dos Negócios Jurídicos da Prefeitura do Município de São Paulo, na gestão da prefeita D. Luiza Erundina. Possui inúmeros artigos publicados em jornais e revistas especializadas, além de ser colaborador do jornal Folha de S. Paulo.

bras Publicadas



O município brasileiro. São Paulo: s.c.p., 1961.

Da atualização do Estado. São Paulo: s.c.p., 1963.

Elementos de teoria geral do Estado. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 1989.

O renascer do direito: direito e vida social; aplicação do direito, direito e política. São Paulo: José Bushatsky, 1976.

O pequeno exército paulista. São Paulo: Perspectiva, 1977.

O futuro do Estado. São Paulo: Moderna, 1980.

Que são direitos da pessoa. São Paulo: Brasiliense, 1981.

Que é participação política. São Paulo: Brasiliense, 1981.

Constituição e Constituinte. São Paulo: Saraiva, 1982.

O direito da criança ao respeito. São Paulo: Summus, 1986.

O Estado Federal. São Paulo: Ática, 1986.

Direito ambiental. Revista Politécnica. São Paulo, n. 204-205, jan./jun. 1992. p. 23-24.

A participação popular e suas conquistas. In: Cidadão constituinte: a saga das emendas populares. Coord. Carlos Michiles et al. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989. p. 378-388.

O Poder Judiciário e a filosofia jurídica na nova Constituição. In: Poder Judiciário e a nova Constituição. São Paulo: Lex, 1990. p. 9-23.

SALVO PELO SENHOR ATRAVÉZ DA IGREJA disse...

VOCÊ PREFERE BARES E BOATES SE ABRINDO QUE IGREJAS NÉ IRMÃO?
ONDE PESSOAS SE DROGAM, SE PROSTITUEM E PRA USAR SEU PRODUTO CHEGA ATÉ A TE ASSALTAR OU ETÉ MESMO TE MATAR.
MAS VEM A PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR NÉ?
"DANDO DINHEIRO PRA PASTOR OTÁRIO"
EU ENTÃO TE RESPONDO:
MELHOR DO QUE QUANDO EU DAVA DINHEIRO PRA TRAFICANTE.
QUANDO VC TIVER UM TEMPINHO AMIGÃO,
ABRA UMA BÍBLIA NO LIVRO DE MATEUS 5.11
E TAMBÉM EM ISAIAS 55.6
DEPOIS NO LIVRO DE ROMANOS 10.9

Anônimo disse...

Caro amigo, seria bem melhor se as pessoas não tivessem que dar seu dinheiro para traficantes e nem para pastores e padres. Seria mais saudável para todos se gastassem seu suado dinheiro com educação, cultura e alimentação de boa qualidade!!!

Anônimo disse...

A verdadeira "ajuda" eh aquela que nao eh cobrada. O que eh cobrado eh mercadoria! Na minha opiniao Jesus nao eh mercadoria e nenhuma "igreja" ou "pastor" deveria cobrar em nome dele. Sera que seu "pastor" consegue falar sobre Jesus por um ano sem cobrar doacoes? Pessoal, ja basta, esta na hora do povo acordar. Conheco muitas pessoas que ajudam pessoas a sairem das drogas sem ter que cobrar 10% do salario pra isso!

Anônimo disse...

Casas de recuperações Para dependentes químicos para se manter e manter o futuros ex-dependentes, precisa de doações, alguém sabe quanto custa um dependente químico em tratamento em uma casa de recuperação?
E em relação as igrejas evangélicas há um principio na biblia, você crê ou não,
Eu creio e sou tremendamente abençoado por isso, sei quanto de dinheiro já dei para droga e sei também irmãos, que de onde vim eu nunca mais voltarei em Nome de Jesus.
Quanto ao amigo anônimo daí de cima, lhe digo irmão, tive sua mesma idéia e opiniões por muitos anos,
Até que um dia conheci um verdadeiro amor que despedaça qualquer julgo e ele me fez entender que tudo que tenho é Dele, não só minha área financeira, mas toda minha vida.
Quero te dizer irmão que entendo e concordo em partes com sua opinião, devido tantos escândalo vistos,
Mas te peço uma coisa, não olhe para isso, olhe pra Jesus,
Ele por mais que você não creia na palavra de Deus ao pé da letra,
Deus por você enviou Jesus para sofrer em um Cruz a mais terrível e humilhante morte na época,
Para que você e eu e toda humanidade, tivesse uma chance de sermos salvos, não por nossas obras, mas pela graça que quer dizer FAVOR NÃO MERECIDO.
Fique com Deus irmão.
Medite em ISAIAS 55.6
Abraço.